06 abril, 2009

/uma fotografia, um nome\

Manuel Magalhães, s/t
© Manuel Magalhães


Na teia de inscrições que uma imagem sempre representa, esta fotografia de Manuel Magalhães fala de arte abstracta.

Não é uma imagem pitoresca, não a vemos como um quadro; essa designação liga-se com a paisagem. Mas aqui, como na imagem pitoresca há, aparentemente, reprodução do original.
Manuel Magalhães faz do mundo real referência – o que se torna claro na pedra que ladeia um hipotético pedaço de muro e na rugosidade da superfície pintada. É uma fotografia que cria o seu referente directo. Mas esse referente, (decididamente enquadrado, com uma sombra que o limita e atravessa) conecta-se na memória do fotógrafo com imagens de pintura abstracta. E este é, afinal, o velho tema da teoria da representação do pós.modernismo.

No entanto, se bem que igualmente agravada como o desafio de Sherrie Levine na sua refotografia de conhecidos fotógrafos, a obra de Manuel Magalhães tendendo a ser a reprodução do imaginário, ancora na realidade. A teoria da representação pós-modernista nega a representação do acontecimento, da exterioridade, já que surge armadilhada com a associação da representação prévia, - essa multidão de imagens apelando ao conhecimento e ao desejo, que hoje faz a nossa aprendizagem.

E, de certo é esse o motivo desta imagem de Manuel Magalhães e é a sua memória e o seu desejo que a constituíram, conhecimento da arte abstracta, desejo de o formular, fotografando o que estava no seu interior.

Ou seja, se a representação é teorizada como origem e não como réplica fotográfica, (pois o fragmento é arbitrariamente perspectivado), esta fotografia informa, acima de tudo, sobre a composição abstracta a que a mesma arte nos habituou e que o fotógrafo isolou na sua consciência e no seu olhar.


O conceptualismo complicou a análise do olhar, criou outros patamares de compreensão. Recusa liminarmente a ingenuidade do fotógrafo e do observador. Tratando da relação palavra-objecto, já o pós-estruturalismo afirmara que o significado apenas se produzia internamente, por ruptura: percebemos o significado de um objecto apenas porque lhe negamos outros significados, é abstracto porque não é naturalista, porque não é barroco, porque não é de intenção futurista… olhar é então argumentar com a nossa memória, com o nosso conhecimento. Olhar e isolar um fragmento é colocar-lhe toda a canga da cultura; uma argumentação interior. Derrida dirá mais, a linguagem, além de arbitrária, é autónoma. A que se liga, pois, o significado?

Precisamente ao agora, ao momento em que um sujeito historicamente situado dá significado ao objecto.

O que continua a causar problemas a quem olha e entende de forma aprazível o significado.
Manuel Magalhães oferece-nos aqui a réplica de um quadro abstracto, sem intenção pictorialista, como uma fotografia directa. A realidade que subjaz à composição é identificável. É uma composição, pois há enquadramento milimétrico; é, de resto, uma escolha feliz. Porque qualquer deambulação sobre o significado da arte a justifica.

Maria do Carmo Serén

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