Kevin Carter, Sudão, 1 de Março de 1993 (© CORBIS/Sygma)
O abutre espera pacientemente o momento para atacar o corpo em agonia de uma criança sudanesa. O fotógrafo, também predador, espera um momento certo para o disparo que garanta o maior dramatismo, o maior impacto à imagem.
Esperam.
Esperam ambos.
No impasse, o fotógrafo desiste, capta a espera do outro e vai-se embora.
Esta fotografia valeu ao sul-africano Kevin Carter um prémio Pulitzer em 1994. Desde que foi publicada na capa do New York Times, transformou-se no seu maior pesadelo. Para onde quer que se voltasse soava a pergunta: “e depois, o que é que fizeste para ajudar a criança?”. Carter não fez nada e essa decisão acabou por lhe toldar a lucidez e levá-lo ao suicídio, no mesmo ano em que foi galardoado.
Kevin Carter começou a carreira como fotojornalista em 1984 no The Johannesburg Star. Retratou o apartheid a partir dos locais mais violentos e perigosos dos arredores da capital sul-africana. Desde a libertação de Mandela, em 1990, até à paz e democracia, em 1994, testemunhou a demência assassina que se instalou em bairros como o Soweto, Tokoza e Katlehong, a lado de outros três fotojornalistas, a saber Ken Oosterbroek, Greg Marinovich e João Silva, um grupo que ficou conhecido por “Bang Bang Club”.
John Carlin, jornalista inglês destacado pelo The Independent para cobrir o conflito sul-africano, traça no El Pais o percurso de Carter e explica como, nestes cenários, se perde a compaixão.
O espanhol Canal + transmite o documentário The Death of Kevin Carter: Casualty of the Bang Bang Club (Dan Krauss, 2004) no sábado, dia 24, às 21h30.
O site oficial do filme, produzido pela HBO, está aqui.
A entrevista com Dan Krauss pode ser lida aqui.
Kevin Carter
6 comentários:
pois... é o tal dilema de VER demais...
Impressionante. Já conhecia a fotografia, mas não sabia da história do suicídio. Dá que pensar...
Sem palavras. Pior do q a imagem é mesmo a pergunta. O q fazemos nós para não haver fotos destas? Ficar chocado não chega. Mas tb não sei por onde começar.
Por um lado revolta-me o excesso da posição de espectador que dispara e vira costas, por outro são estas imagens que por nos chocarem nos fazem reagir e por isso são essenciais. Prefiro gostar da fotografia como ela é e pensar que ele cometeu um grave erro humano que ele tinha de resolver com ele próprio e com a crítica já que fez questão de relatar a forma como obteu a fotografia.
Certamente o melhor Post.
É torno dos sentimentos que se vive, nem que eles cheguem tarde demais...
Comentário de Maria Sousa (enviado por e-mail):
"Sou uma fiel seguidora deste blog há muito tempo e muitas vezes retiro indicações/sugestões e divulgo, com a devida referência, no meu blog. Esta fotografia já passou tantas vezes pelos meus olhos e todas as vezes me perguntava que era feito desta criança... Agora já sei que foi salva por um jovem chamado Carter, um pouco tarde, mas ainda a tempo de espantar todos os abutres deste mundo menos os que estavam dentro dele. Uma fotografia imensa, uma lição de vida intensa. Obrigado pela partilha.
O meu blog: http://mariapudim.blogspot.com/"
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