16 março, 2007

lisboa

Lisboa, Rua do Arsenal, 1858, Colecção Alcídia e Luís Viegas Belchior
(© CNF 2705_26, CPF/MC)

O Centro Português de Fotografia inaugurou recentemente uma nova exposição no seu edifício sede, a Cadeia da Relação. O conjunto de imagens que agora se mostra faz parte do espólio Alcídia e Luís Viegas Belchior, comprado em Julho do ano passado pelo CPF por 230 mil euros. Esta colecção tem mais de 4800 imagens e enriquece de forma significativa a Colecção Nacional de Fotografia. Entre vários nomes importantes da fotografia portuguesa do século XIX, há ainda neste rico espólio vários núcleos de imagens de fotógrafos estrangeiros que passaram por Portugal, como é o caso do francês Amédée Lemaire de Ternante. São dele estas fotografias raras de Lisboa. Maria do Carmo Serén explica a exposição assim:

Em finais de Abril de 1858, D.Pedro V casa com a brevíssima rainha D.Estefânia. Tinham ambos 21 anos e o casamento duraria pouco mais de um ano. Em 1859 a rainha morre de difteria e o rei dois anos depois. Com D. Estefânia, que já aprendera português, desloca-se uma pequena corte e artistas diversos, que inclui o já então conhecido pintor e fotógrafo francês Amédée Lemaire de Ternante. Esta é, pois, a Lisboa desse ano ainda feliz e representa, ao que se sabe, um dos mais antigos e mais ricos conjuntos de imagens da capital e, pela diversidade dos temas abordados, um dos mais esclarecedores do país.
Trata-se de albuminas originais, respondendo ao objectivo de descoberta e de registo da capital do reino, apontando aspectos do património monumental, (os Jerónimos com a sua patine e erosão antes do restauro, a Torre de Belém, com as velhas galés de passeio ao fundo e, em primeiro plano, a seca das redes dos pescadores, a igreja da Estrela, o Aqueduto das Águas Livres, o Paço das Necessidades, o Chafariz d`El Rei, em Alfama), mas também vistas gerais da cidade. Não apenas o litoral obrigatório avistado do casario mais elevado, mas também S. Pedro de Alcântara e as muitas aldeias que permaneciam incólumes no interior da cidade e a panorâmica que se desfruta nos acontecimentos: as tribunas de recepção frente ao Cais das Colunas.
Já em estúdio, (um interior bastante elementar e um jardim onde uma cadeira permite o indispensável apoio) reencontramos a sociedade colunável, homens de canecão ou chapéu mole, suíças e bandós, mulheres com saias de balão à Imperatriz Eugénia, tão crispados, afinal, como os grupos populares que Ternante capta no quotidiano. Nos instantâneos, os rostos em movimento provam-nos a dificuldade da fotografia sem pose, mas também a sua ainda relativa novidade para o público comum.
E aquele retrato de Castilho, entre o solene e o 'habitué'. Afinal Castilho cedo se deixara fotografar em daguerreótipo, tornando bem conhecida, em artigo de imprensa, a estranha relação que se estabelece entre o fotógrafo e o fotografado.
A mostra suscitará olhares diversos, do historiador, do urbanista ou do curioso dessa já velha identidade que desbaratamos. Mas também do esteta, pois aqui e ali, certas composições falam bem da intenção do seu autor e deste nosso inabalável compromisso estético com tudo o que é reconhecido e traz consigo pergaminhos de antiguidade.

D. Maria Ana, irmã de D. Pedro V (?), 1858, Colecção Alcídia e Luís Viegas Belchior
(© CNF 2705_02, CPF/MC)

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