Já lá vão alguns dias sobre o segundo leilão de fotografia em Portugal, mas, ainda assim, julgo que vale a pena fazer um apanhado do que se passou no CCB.
Depois do efeito novidade e do entusiasmo gerados à volta do primeiro leilão de fotografia (1 de Junho), a segunda venda, apenas cinco meses depois, serviria, sobretudo, para perceber se existem de facto compradores para imagens antigas em Portugal. O leilão de 9 de Novembro mostrou que sim, mas deixou alguns sinais que devem ser considerados pela organização, a cargo da Potássio 4 e da Livraria Campos Trindade: os compradores sabem o que estão a comprar; alguns lotes apresentados como estrelas do leilão foram retirados de praça porque tinham preços demasiado elevados; a exigência com o estado de conservação dos lotes - havia algumas imagens em mau estado ou em muito mau estado - deverá ser cada vez maior; a quantidade de lotes envolvidos neste leilão fez com que a venda se transformasse numa maratona demasiado longa e por vezes demasiado frenética, prejudicando raciocínios mais lentos, sobretudo por parte daqueles que não tiveram oportunidade de ver os lotes antes do leilão; o fraco interesse manifestado pelos poucos lotes de fotografia contemporânea na praça mostra que um eventual leilão centrado em imagens mais recentes deve ter um elevado grau de exigência em relação à qualidade estética ou à importância histórica dessas imagens.
A percentagem de lotes vendidos, 62 por cento, é um sinal, ainda que tímido, de que afinal existe um grupo de interessados disposto a comprar fotografia de forma sistemática. Em 400 lotes foram retirados 149, o que não deixa de ser um bom indicador para vendas futuras.
Quanto à organização, este segundo leilão revelou nítidos progressos, como a projecção em tela gigante das imagens em praça, que só por uma ou duas vezes falhou, ou a entrega mais eficaz e organizada dos lotes vendidos.
Surpresas
ESTEREOSCOPIA
Lote 11 (vista da Rua Augusta, Lisboa, cerca de 1900)
Preço: 15 euros (preço de venda 55 euros)
Lote 12 (desfile militar em Lisboa, cerca de 1890)
Preço: 15 euros (preço de venda 45 euros)
Os preços iniciais destas duas vistas estereoscópicas foram largamente ultrapassados por um motivo óbvio: todas as imagens de ruas que sofreram mudanças significativas no decorrer dos anos ganham um duplo valor histórico.
ÁLBUNS DE VIAGENS E OUTROS
Lote 49 (álbum de África com o monograma do rei D. Carlos (RCA, ?), cerca de 1890)
Preço: 750 euros (preço de venda 1100 euros)
As fotografias de África do século XIX são sempre imagens a ter conta. O facto de existir a possibilidade deste álbum ter pertencido ao rei D. Carlos dava-lhe um valor acrescido que se veio a confirmar na altura de levantar as placas na sala.
MONARQUIA
Lote 57 (desembarque da rainha D. Maria Pia no terreiro do Paço a 6 de Outubro de 1862)
Preço: 90 euros (preço de venda 260 euros)
É o caso de uma imagem valorizada essencialmente pelo seu carácter histórico, em contraponto com o mau estado de conservação em que se encontra. Foi a protagonista da primeira grande série de licitações da noite.
ARTES E ARTISTAS
Lote 265 (Fernando Pessoa aos 10 anos, 1898)
Preço: 800 euros (preço de venda 8500 euros)
Foi a fotografia que animou o leilão que até este lote não tinha tido ainda uma disputa tão surpreendente. O preço final desta carte-de-visite, arrematada por um alfarrabista de Lisboa, constitui um recorde para venda de fotografias em Portugal.
LIVROS E EDIÇÕES
Lote 376 (Portugal 1934)
Preço: 300 euros (preço de venda: 1375 euros)
É uma obra essencial para se perceber o uso da fotografia e da fotomontagem pela máquina do Estado Novo que, à data de publicação desta folhetim de propaganda nacionalista e imperialista, tinha acabado de contratar o antigo jornalista do Diário de Notícias António Ferro para liderar o Secretariado de Propaganda Nacional.
Lote 380 (Images Portugaises)
Preço: 30 euros (preço de venda: 140 euros)
Outra edição do período do Estado Novo alvo de grande interesse. A maior parte das imagens reproduzidas no livro são da autoria de Horácio Novais, um dos colaboradores mais assíduos do SPN e mais tarde do SNI.
Desilusões
DAGUERREÓTIPOS, AMBRÓTIPOS E FERRÓTIPOS
Lotes de 1 a 10 (retratos, várias datas)
Preço: (vários preços)
O leilão começou com a venda de daguerreótipos e começou mal. Seguiram-se outros processos da infância da fotografia, mas os lotes foram sendo devolvidos à procedência. As peças que foram levadas à praça tinham de facto pouco interesse para os coleccionadores portugueses. Apenas o lote 1, que foi vendido à posteriori, retratava portugueses.
ÁLBUNS DE VIAGEM E OUTROS
Lote 45 (álbum dos Jogos Olímpicos de Berlim, 1936)
Preço: 400 euros (preço de venda 220 euros)
Foi apresentado como uma das estrelas do leilão, mas o interesse na sala acabou por não se verificar. O pregoeiro viu-se obrigado a baixar o preço-base para metade para que alguém levantasse a placa.
Lote 50 (álbum com várias vistas de cidades europeias, cerca de 1880)
Preço: 1000 euros (retirado)
É um lote que reunia várias condições para que os compradores fizessem as suas propostas, não fosse um pormenor a eclipsar essas mais-valias: o preço. Foi o primeiro lote de vulto a ser retirado de praça.
MONARQUIA
Lote 64 (rainha D. Amélia com os príncipes D. Luís Filipe, D. Manuel e respectiva comitiva no Egipto)
Preço: 1500 euros (retirada)
O pregoeiro até baixou 500 euros ao preço inicial, mas o registo da viagem da rainha e do seu séquito ao Egipto não suscitou a mínima reacção por parte dos compradores. Para além de bem documentada, a fotografia apresentava um estado de conservação excepcional. Argumentos que não convenceram.
CARLOS RELVAS E MARIANA RELVAS
Lote 70 (retrato de Mariana Relvas e Carlos Relvas)
Preço: 600 euros (retirada)
O que se passou no primeiro leilão com uma fotografia de Carlos Relvas (escolhida para capa do catálogo do leilão) fazia antever o pior para o conjunto de imagens do fotógrafo da Golegã apresentadas nesta venda. No dia 1 de Junho, a paisagem ribatejana levada à praça foi vendida a custo. Neste leilão, nem os saldos oferecidos pelo pregoeiro salvaram o "amador" da lezíria que dos seis lotes em disputa (da sua autoria e de Mariana Relvas) só três foram vendidos por metade do preço-base.
PERSONALIDADES
Lote 123 (Oliveira Salazar, 1931)
Preço: 200 euros (retirada)
Era uma daquelas fotografias que à partida estaria vendida, quer pela excepcionalidade do momento captado pelo fotojornalista Ferreira da Cunha, quer pela importância histórica da imagem. Só que quando se apresentou o lote 123, ninguém disse nada. A imagem haveria de ser vendida à posteriori por 230 euros.
DESPORTO
Lotes 213 a 224
Preço: vários preços
Foi uma das apostas perdidas neste leilão. As fotografias relacionadas com temas de desporto suscitaram pouco interesse na sala. O pregoeiro tentou, outra vez, preços mais baixos do que estava estipulado no catálogo, mas nem assim os compradores decidiram levar para casa figuras como Eusébio, Coluna ou Torres.
FOTOGRAFIA DE AUTOR
Lote 295 (Saudades do Mar, de Constantino Varela Cid, 1940)
Preço: 600 euros (retirada)
Era uma das melhores fotografias do leilão. Ficou sem comprador, tal como os restantes lotes de Varela Cid.
LIVROS E EDIÇÕES
Lote 377 (álbum com várias vistas da região de Sintra)
Preço: 2000 euros (retirada)
O lote mais caro do leilão não despertou a mínima curiosidade na sala.
A Potássio 4 colocou os resultados globais deste leilão aqui.
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