
Há três exposições novas no Centro Português de Fotografia:
1. El Lamento de los Muros, da argentina Paula Luttringer, partiu dos relatos de 50 mulheres que, à semelhança da fotógrafa, se incluem num grupo de uma centena de milhar de pessoas raptadas e presas pela ditadura militar do general Videla (1976-1983). As imagens revelam os espaços lúgubres de cadeias onde os chamados “desaparecidos” foram encarcerados. Do que se conhece, 30 mil pessoas morreram e mais 100 mil foram interrogadas em prisões clandestinas, encapuçadas e drogadas para não reconhecerem o local do crime nem os seus carrascos.
O jornalista do PÚBLICO Jorge Marmelo conversou com a fotógrafa. A entrevista saiu no jornal de sexta-feira.
“Um dia entendi finalmente que, enquanto estive presa, permaneci a maior parte do tempo com os olhos vendados e que vivi essa realidade vendo apenas parcelas dela. Dei-me, então, conta de que essas fotos, que também para mim são as mais confusas, mais ambíguas, são as que melhor reflectem aquilo que eu vivi, porque sempre estava a ver as coisas por baixo de uma venda. Confesso que temi que ninguém entendesse nada deste trabalho”
Paula Luttringer, Público, 28.07.2006
“Esta colecção de imagens é um testemunho de uma realidade que não tem lugar, que não pode ter lugar, porque a memória dela apenas se guardou nas lacunas do sentir.
(...)
As imagens evocam os lugares que se sabe foram prisões clandestinas.
Mostram, como só as fotografias o fazem, a ausência do inenarrável, um vazio que se preenche com os testemunhos de quem não esquece e a quem não deixam esquecer. Como aquela imagem onde uma sombra opressora se projecta sobre um muro de betão e a luz parece moldar a permanência frágil de uma memória de dor.”
Maria do Carmo Serén, texto de apresentação da exposição, 2006

2. Vesúvio, de Marta Sicurella, que foi Prémio Pedro Miguel Frade (CPF), concentra-se na contemplação turística das cidades, no acto de ver turisticamente. Nas imagens panorâmicas quase só se vê o céu e quem vê. É o Vesúvio, mas podia ser outro sítio, onde a febre turística tudo atropela, tudo quer ver.
“E assim se constrói o estatuto de objecto fotográfico que explica a situação fotografada, mas onde o objecto está ausente. Recurso que se conhecia nas imagens onde o tema apenas se manifesta em reflexo, em sombra, em ausência.”
Maria do Carmo Serén, texto de apresentação da exposição, 2006

3. África pelos Africanos, de vários autores (1900-2000), prolonga um ciclo de imagens de vários países captadas por fotógrafos deste continente.
“É um passeio pelos muitos países africanos, da Argélia ou Senegal a Madagascar ou África do Sul, do Zimbabwé ao Togo, e, ainda dos países de língua portuguesa, a Guiné, Angola, Moçambique, onde a paisagem, aquela imensidão suspensa sob o Sol, que fez a nossa memória de África, está quase ausente: essa África é apenas um mito para os europeus.
(...)
É um passeio demorado, a fixar nomes de fotógrafos experimentados, de artistas ainda desconhecidos. É também uma história político-social, económica e cultural, de encontros e periferias de terra e de alma, da estranheza daquela organização caótica que se repete nos lugares, no espaço cénico, nas colagens.
É uma história do corpo, sim, é uma história do corpo. Mas sobre isso tudo é uma história de olhares. Muitos olhares.”
Maria do Carmo Serén, texto de apresentação da exposição, 2006
1 comentário:
A fotografia da exposição "A África pelos Africanos" é linda. Os olhos da mulher africana são hipnotizantes sem, contudo, revelar o que quer que seja de si mesma. Não sabemos o que sente, nem quem é, o que faz ou o que deseja...
Parabéns pelo magnífico blogue. Pela sua riqueza e beleza.
Rita
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