18 julho, 2009

Glory Days

Sergei Bratkov, da série Raparigas do Exército, 2000
© Sergei Bratkov, cortesia Regina Gallery, Moscovo


Sergei Bratkov
Onde estão os dias de glória?
(P2
, 18.07.2009)

Aparecem galhofeiros em fatiotas garridas, tropas em pose escultural, camisolas com bonecos famosos e futuros radiosos. Os sinais de um mundo cor-de-rosa estão sublinhados. Entram-nos pelos olhos a um ponto que nos leva a acreditar que o paraíso existe, que anda quase toda a gente feliz e contente, em dias soalheiros que convidam a meter a cabeça na água. Estarão aqui os dias gloriosos? O paraíso até pode existir, mas não mora nestas imagens. E se há glória colada às fotografias de Sergei Bratkov (Kharkov, Ucrânia, 1960) é só no título da exposição que reúne os seus últimos 20 anos de trabalho. Glory Days é mais do que um nome irónico, é uma provocação e uma crítica mordaz à realidade social que saiu da fragmentação soviética e à ressaca da experiência política comunista que não estilhaçou apenas geografias - abalou identidades e desnorteou experiências de vida, como a do próprio fotógrafo que diz ter nascido "num país que já não existe".

O protagonista das mais de 130 fotografias e quatro vídeos que Sergei Bratkov apresenta em Madrid até 30 de Agosto na belíssima Sala Canal Isabel II (exposição integrada no festival PhotoEspaña), é o mundo do pós-comunismo e muitos dos estereótipos que lhe estão associados. E um dos rasgos de originalidade do seu trabalho - muito inspirado e dialogante com o do seu conterrâneo Boris Mikhailov - está precisamente nessa reflexão sobre os estereótipos sem nunca chegar a produzir nenhum deles (Boris Buden). À reprodução fácil e folclórica, Bratkov responde com registos baseados na "desconstrução" e na "subversão" do que o rodeia.

Num certo sentido, e à primeira leitura, o realismo fotográfico de Bratkov mente. Porque nos dá pistas enganadoras e conjuntos de referentes que aparentam ser aquilo que não são. É um método de trabalho que tenta mostrar a realidade pela subjectividade, pela ambiguidade e pela mensagem subliminar, sempre com a crítica ideológica como horizonte. Bratkov serve-nos a glória e transporta-nos para um imaginário hollywoodesco ao mesmo tempo que nos mostra, sem moralismos, a delinquência juvenil, a inocência perdida e a ilusão do império e da supremacia militar. É um mundo onde se revela "um fracassado começo do zero". E onde se mostra uma sociedade com a cabeça meia dentro, meia fora de água.

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