13 outubro, 2008

Outro Korda

Auto-retrato, Alberto Korda

Korda queria conhecer as mulheres mais bonitas de Cuba

Sérgio C. Andrade
(Público, P2, 13.10.2008)

Acabar de vez com a ideia de que Alberto Korda (Havana, 1928-Paris, 2001) foi o autor de uma só fotografia - a de Che Guevara, Guerrilheiro Heróico, que o tempo transformou num ícone da Revolução - ou que foi o fotógrafo oficial da revolução cubana. É esta a principal virtude da exposição Korda conhecido, desconhecido, na Fonoteca de Havana, e que tem registado um êxito sem precedentes junto do público da capital cubana.

"Só dez por cento da sua obra tem a ver com o tema da revolução", diz a sua filha, Diana Díaz (o pai chamava-se Alberto Díaz Gutiérrez, e corre que escolheu o apelido Korda por causa da sua parecença fonética com Kodak!). No próximo mês de Dezembro, a exposição de Korda vai ser mostrada em Madrid, na Casa da América, e é a pretexto disso que o jornal El País ouviu a filha do fotógrafo e também Cristina Vives, comissária da exposição em parceria com o jornalista Marck Sanders (os dois são igualmente autores do livro-catálogo homónimo já editado em Espanha).

"Korda não só foi uma testemunha de excepção dos anos épicos da revolução cubana, foi um artista incrivelmente moderno", diz Cristina Vives ao El País. "As fotografias de mulheres que ele fez no seu estúdio nos anos 50 são verdadeiramente revolucionárias. E esse trabalho de composição com modelos, ele iria mais tarde aplicá-lo aos líderes guerrilheiros."

A exposição, subdividida em cinco capítulos - Estúdios Korda, Os líderes, O povo, A mulher e O mar -, revela uma vertente marcante, e até agora desconhecida, da produção de Korda na década de 1950. Foram os anos em que ele decidiu virar-se para a fotografia de moda e montar um estúdio com o seu nome em Havana, "para poder conhecer as mulheres mais bonitas de Cuba", confidenciou o artista a Marck Sanders, na última entrevista que deu antes de morrer, de ataque cardíaco, em 2001, em Paris, onde se deslocara para acompanhar uma exposição individual.

Nas fotografias dessa época, Korda retratava os corpos e os perfis de modelos belas e exuberantes, como Norka ou Julia, que mais tarde viriam a tornar-se suas mulheres. Remonta a esse tempo "um espírito Estúdios Korda", que Cristina Vives reclama como sendo "arte de vanguarda".Foi no final dos anos 50 que o fotógrafo se envolveu com os ideais e com o movimento revolucionário - um dia, fotografou A menina com a boneca de palha e viu aí a metáfora de um povo explorado e empobrecido num país a precisar de mudança.

Guerrilheiros e modelos
Durante uma década, dedicou-se à causa da revolução, que divulgou e celebrou em fotografias que correram o mundo e se tornaram célebres, como a do Guerrilheiro Heróico ou a Entrada de Camilo Cienfuegos e Fidel Castro em Havana. "Mas ele não foi o fotógrafo oficial do regime, foi antes um electrão livre", reclama a sua filha Diana, explicando que foi a sua amizade com Fidel que lhe permitiu captar instantâneos que ninguém mais conseguiu. Isso é agora visível na exposição (e no livro), em fotos inéditas ou pouco conhecidas do líder da revolução a comer um gelado com Che Guevara, em pijama, ou então rodeado por um grupo de excitadas "rainhas da rádio de Nova Iorque".

Mas até as suas fotos mais conhecidas dos protagonistas da revolução "têm um ângulo distinto" e manifestam "o seu meticuloso trabalho de edição, que convertia as imagens originais em algo diferente", nota Cristina Vives, acrescentando que Korda "retratou os guerrilheiros como se eles fossem modelos".

Há uma justificação histórica para o facto de a obra "pré-revolucão" e exterior a esta dimensão mais política ser a menos conhecida de Korda. Em 1968, e como aconteceu à maioria dos negócios privados, o seu estúdio em Havana foi nacionalizado e as chapas que retratavam o movimento de Fidel (cerca de 50 mil) foram depositadas no Arquivo Histórico do Conselho de Estado. O restante trabalho desapareceu - houve, na altura, quem achasse as fotografias "pornográficas".

Na década seguinte, Korda virou-se para a fotografia submarina (fundou mesmo o Departamento Subaquático da Academia das Ciências) e chegou a ganhar prémios internacionais, em Itália e no Japão, com as suas fotografias, mas também estas viriam a desaparecer.

Parte delas foi agora recuperada por Cristina Vives e Marck Sanders em velhas revistas - como a Carteles, onde Korda fotografava as beldades do cinema, que eram comentadas pela pena do escritor Guillermo Cabrera Infante, sob o pseudónimo de G. Caín, conta o El País -, e em arquivos privados.


Korda numa sessão de moda

1 comentário:

Anónimo disse...

Será possível saber quais os anos de realização dos auto-retratos postados? Muito obrigado. Daniel

 
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