... José Manuel Rodrigues
Lisboa quase nunca fez parte do roteiro das exposições de José Manuel Rodrigues (Lisboa, 1951). E foi preciso esperar mais de duas dezenas de anos até que Jorge Calado organizasse aqui uma grande exposição individual (Ofertório, 1999), que foi, simultaneamente, a primeira em Portugal. Depois de mais um longo interregno na capital, o fotógrafo alentejano regressa com a exposição Elementos, que inaugura uma nova galeria exclusivamente dedicada à fotografia contemporânea, a Pente 10. A poucos dias da abertura, conversámos sobre o novo trabalho, a fotografia digital a cores e as relações entre o Homem e a Natureza. Aqui fica um resumo desse encontro:
Organizar a exposição
Organizar esta exposição foi um pouco complicado porque o espaço da galeria estava a ser construído e esta exposição tem algo de especial. Foi evoluindo também consoante as obras da galeria. Foi uma experiência nova, quase um diálogo entre arquitectura e fotografia. Tentei mostrar um determinado tipo de sedução para a natureza. Ela chama-se Elementos, porque eles estão presentes. Mas gostava que ela fosse um encontro entre a paixão que temos entre nós e a paixão em relação à Natureza.
Os Elementos na planície
Tenho um grande relacionamento com o Alentejo, claro. O Alentejo é uma zona do país que tem muito poucas pessoas, e isso dá uma oportunidade especial à natureza de, nalguns sítios, ainda estar mais ou menos virgem. Não era capaz de fotografar com grandes angulares, e desde que estou no Alentejo comecei a fotografar com angulares. Em sentido prático, estou muito interessado no problema de escala, da relação positivo/negativo. No Alentejo esse problema de escala - estamos a falar no infinito - coloca-se. E estou também interessado nessa relação do Homem com aquilo de que ele precisa para viver directamente, do contacto com a terra e também aquilo que a natureza nos dá, esse modo contemplativo e de encontro com nós próprios, com a vegetação ou com os animais.
Fotografar o quê?
Agora estou muito interessado no retrato, na presença humana, naquilo que é a felicidade, o que leva as pessoas a fazer determinado tipo de coisas, a relação do Homem com a Natureza, com os seus parceiros. Estou tentando associar a questão do trabalho com conhecimentos ancestrais, que é o conhecimento empírico ... E, neste momento, estou muito interessado no retrato.
(...)
Acho que o acto de fotografar é um tipo de arrumação, uma arrumação especial. Estou muito interessado em fotografar aquilo que não vejo, aquilo que está atrás de mim, atrás dos meus olhos, e, de certa medida, utilizo os meus modelos, utilizo até a própria natureza também para me encontrar a mim próprio.
(...)
Nesta exposição há uma certa geometria. Há uma coisa talvez nova que é este diálogo entre duas facetas, esse tipo de sedução entre um lado positivo e um lado negativo. É como se, na prática, estivesse a pôr a fotografia dentro da própria imagem e a imagem olhar para dentro da imagem. O olhar em si das pessoas talvez esteja a deixar de me interessar no retrato.
(...)
Esta exposição também é uma ode à natureza. Há aqui quatro ou cinco retratos porque nós pertencemos a este grupo que está em confronto com a Natureza e com os animais (...) Há um vitelo aqui nesta exposição que é a parte fulcral - representa fragilidade. É mais confronto do que harmonia, sobretudo também por causa desta oposição entre positivo e negativo e de ter virado algumas coisas ao contrário.
(...)
Sou obcecado pelo detalhe, mas é verdade que muitas das minhas fotografias escondem algo que está muito evidente, mas que, de vez em quando, à primeira não se nota na imagem. Eu tento mais excluir do que incluir, isso é seguro. Se consigo, não sei.
A água, o fogo
A água tem sido sempre ao longo do meu percurso o mais importante. Pela sua fluidez, pelo seu reflexo, é como a continuação da objectiva e é soft, tem esta coisa especial de reflectir e mudar continuamente. O fogo, claro, fascina-nos a todos, as mudanças de cores, a destruição e a transformação da massa. É quase, num sentido figurativo, um juízo final, e ao mesmo tempo é também um elemento como a água, que mexe, é volátil. E a fotografia congela determinado tipo de momentos, por exemplo da água e do fogo, de que nós não nos podemos aperceber totalmente... Isso fascina-me.
...e o mais difícil?
Talvez o ar... Só podemos senti-lo, não o podemos apalpar... Tenho uma fotografia em que tentei voar, que eu gosto muito, mas é mais uma sensação de sentir. Tenho tido problemas de respiração, por isso o ar... tenho tido quase um conflito com ele para o fotografar. É mais desafiante, mas até agora não tenho conseguido grandes resultados - ele tem-me vencido, até fisicamente.
Novas técnicas
Há pouco tempo a Madrid vi uma exposição do Velásquez no Prado e reparei que a lógica de algumas das técnicas modernas, por exemplo Photoshop, já era usada no final do séc. XVII. Sempre fizémos esse tipo de aproximação e de retoque. Na pintura nota-se mais. (...)
(...)
Comecei a fotografar com suporte digital há algum tempo e isso colocou-me um problema: ter de fotografar duas vezes. Ou seja, primeiro capto a imagem sempre a cores e depois tenho de "refotografá-la" a preto e branco. Isso foi um grande conflito que demorou quase dois anos a ultrapassar e durante esse tempo apercebi-me de que também havia fotografia a cores. Foi uma novidade para mim, a fotografia digital trouxe-me coisas positivas. (...) Apesar de as minhas fotografias a cores, a bem dizer, só terem dois tons, uma coisa que eu reparei há pouco tempo, continuo a fotografar a preto e branco, mas em vez de ser preto e branco pode ser um azul mais claro ou um azul mais escuro, é tudo dual tone. É esquisito. Mas a fotografia a cores está a ser como dantes. Agora consigo controlar todo o processo e isso está a impor-me uma certa disciplina que eu também tinha a preto e branco, na câmara escura, e está a mudar algo em mim. A maneira de fotografar e de... Quer dizer eu gosto muito da fotografia e de todo o processo fotográfico, vivo-o intensamente. Estas impressões também são minhas e isso, esse controle de cor tão preciso é uma novidade, dá-me um grande prazer controlar por zonas, acho isso muito interessante. Depois é um risco, é um crime que compensa porque eu gosto muito de perfeição, e de atingir o máximo dentro das minhas limitações, de conseguir o máximo. Acho que a aventura na minha vida também tem essa parte. Tento controlar todo o processo desde o princípio até ao fim. Esse controle dá-me um grande prazer.
Errância
(...) A minha fotografia está muito ligada directamente ao meu estado existencial e às minhas ligações, às minhas relações. Quando vim para Portugal vinha com uma ideia de fotografar profundamente o nosso país. E como emigrante seduzia-me muito a nossa cultura, as profundezas da nossa sociedade, e, passado algum tempo, já cá dentro, fiquei desiludido com o próprio país. E esta relação influenciou o meu trabalho. (...) A minha fotografia também é um espelho do caos da minha existência.
Sedução?
Não me apercebi de que a imagem que enviei no convite - que achei sedutora, um tipo de sedução ligado ao sexo, à idade, ao vermelho e a outro tipo de elementos - também tinha um conteúdo de uma grande tragédia. Algumas pessoas que receberam o convite disseram-me: "vou mandar-te o convite de volta, detesto a imagem". É violenta, e eu não me tinha apercebido de que era tão violenta.
Voltar
É uma grande honra, uma oportunidade e um desafio voltar a Lisboa para inaugurar um espaço novo. Acho que vai melhorar o meu trabalho. (...) Não tenho cuidado da minha imagem, dos meus contactos... e este ponto de partida talvez seja para mim um novo começo - por isso, dois começos.
1 comentário:
Esse senhor não devia expor. O trabalho é tão mau e desinteressante que não devia ter espaço em lugar nenhum.
Que péssima articulação de ideias também. Disparates atrás de disparates.
Há pessoas que ganharam nome por não haver concorrência. Eis uma delas.
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