30 março, 2006

O ministro e a fotografia

Candida Höfer, Palácio da Horta Seca, Lisboa I , 2005


Não é comum, mas de vez em quando lá acontece – haver um ministro com queda para as artes. Manuel Pinho, que tutela a pasta da Economia e Inovação, colecciona fotografia contemporânea e ao que consta tem um espólio que prima pelo bom gosto. Dessa sensibilidade do ministro para a imagem fotográfica surgiu uma exposição que se estende por vários espaços do Ministério, instalado no Palácio da Horta Seca. Entre os fotógrafos escolhidos pelo comissário Delfim Sardo há artistas consagrados (Helena Almeida, Jorge Molder e a alemã Candida Höfer), artistas com a carreira lançada (Vasco Araújo) e artistas em princípio de carreira (Cecília Costa). Com esta mostra, Manuel Pinho quer “abrir” o Ministério e aproximá-lo “das pessoas e das empresas” (Público, 19.03.2006). Acredito que a ideia resulte.
O Fio do Horizonte de Eduardo Prado Coelho (Público, 20.03.2006) fala da exposição no Palácio da Horta Seca e da importância da “dimensão estética” nos principais centros de decisão.

"Formas de ver o mundo
Poderia parecer desconchavado, mas a verdade é que o exemplo do ministro da Economia tem vindo a proliferar. A Assembleia da República foi buscar à colecção de Serralves materiais para fazer uma exposição intitulada “O poder da arte”. Diversos ministros querem fotografias nos seus gabinetes. e o ministério da Economia reincidiu e inaugurou uma exposição com fotografias de diversos tipos. Gestos fúteis? Não creio. Antes um gosto para envolver o local de trabalho numa dimensão estética, com obras de arte e elementos que tenham um “design” que seja ao mesmo tempo funcional e belo.
Não significa isto que passem o Conselho de Ministros a debaterem as qualidades de Philip- Lorca Dicorcia ou Cindy Sherman. Mas esta preocupação poderá dar mais força à ideia da necessidade de uma política cultural.
Quanto a Manuel Pinho, o ministro da Economia, já sabíamos o seu gosto pela fotografia. Sobre a sua colecção pessoal, escrevi um dia uma crónica. Agora, com o apoio amigo do Albano Silva Pereira, conseguiu que o seu próprio gabinete, os gabinetes dos secretários de Estado, os corredores do belíssimo palácio da rua da Horta Seca, as salas de reunião, se tornassem numa verdadeira galeria de arte. A qualidade das fotografias é certamente assinalável.
Gomes de Pinho, Presidente da Fundação de Serralves, tece algumas considerações interessantes sobre a oportunidade da iniciativa. A sua ideia central é a de que o universo determinista que dominou as concepções da economia e sobretudo gestão, implicando decisões que partiam de uma previsibilidade implacável, chegou ao fim. E com esse fim desaparece “um paradigma de gestão e os seus mitos”.
O que sucede hoje no mundo da economia é o aparecimento de um novo paradigma: tal como se navega à vela, e tem que se ter em conta o capricho dos ventos, ou se faz “surf” (lembram-se como Deleuze ia buscar ao “surf” o modelo do pensamento contemporâneo), é hoje necessário ter em conta “a incerteza, as transformações rápidas, os novos valores emergentes”.
E daí esta tese essencial: “O que se espera dos gestores, hoje, é que se comportem cada vez mais como artistas, que sejam criativos, imaginativos, intuitivos, visionários. Capazes não só de compreender a mudança, mas de antecipar. De ter, não apenas um projecto de negócio, mas a capacidade de gerir uma multiplicidade de variáveis e facetas da realidade ela própria em rápida mutação. Não terão então os gestores muito a aprender com os artistas”.
Donde, arte e economia não vivem separadas, mas cada vez mais próximas. O que Manuel Pinho parece ter entendido antes de muitos outros.
A exposição agora apresentada não tem nenhum fio condutor a não ser a qualidade do que é mostrado. Comissariou-a Delfim Sardo. Temos grandes nomes da arte portuguesa contemporânea, como Helena Almeida ou Jorge Molder. Assim como nomes mais jovens (Vasco Araújo e Cecília Costa). Um caso particularmente interessante é o da alemã Candida Hofer: as fotografias são as do próprio palacete em que são expostas. Mas as varandas e as escadarias vazias, para além de um tapete vermelho, criam uma atmosfera de ópera ausente que não pode deixar de nos atrair." (Eduardo Prado Coelho, in Público, 20-03-2006)


12.3
Ministério da Economia e Inovação
Rua da Horta Seca, nº 15.
Tel.: 213 245 400. De 2ª a 6ª das 17h00 às 20h00.
Até 18 de Abril. Entrada livre.

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