09 outubro, 2014

BESPhoto - balanço




BESPhoto 2014
© David Rato


O que se ganhou (e o que se perdeu) 
(crónica, ípsilon, 06.06.2014, sendo que, entretanto, já mudaram algumas coisas)

Isto desde que o Jorge Jesus e a Paula Rego deram as mãos e trocaram piropos dentro de uma chaminé gigante em Cascais, futebol e arte são um só. Por isso, vamos lá.

Aqui há dias, a conquista da décima orelhuda pelo Real Madrid deu-nos um pouco de tudo. Foi uma final da Liga dos Campeões memorável a vários níveis: houve espectáculo, intensidade, drama, surpresa, reviravolta, imprevisibilidade, nervos e espanto. Houve vários momentos fotográficos (incluindo, claro, o de Ronaldo a exibir sem pudor a massa de que é feito) e um ou outro cinematográfico (como o de Sérgio Ramos a marcar milimetricamente o golo do empate a segundos do fim). Houve um duelo titânico de dois rivais muito próximos, que perceberam que só o facto de terem chegado aonde chegaram os transformaria em heróis. Seria a décima taça orelhuda para uns, a primeira para outros. Ficou o Real com ela, como bem sabemos, e agora dizem que foi ultrapassada uma pequena maldição — a da décima, que escapava aos merengues desde 2002. 

Pelo grito de raiva que significou, e como a arte da bola tem estado tão ligada a outras artes ditas belas, a conquista da décima pelo Real Madrid talvez seja um bom exemplo para outras décimas. Ainda que o campeonato seja outro, a décima do BESPhoto, que este ano se cumpre, bem pode olhar para o que se passou no Estádio da Luz e de lá tirar a inspiração para chegar à 11.ª, à 12.ª… (momento terapia de casal: parece que o que custa mais são os primeiros dez anos). 

Sou pela diversidade. Acho que o Prémio BESPhoto faz falta. Ao longo dos anos, o verniz estalou várias vezes. Houve quem recusasse a nomeação (João Maria Gusmão/Pedro Paiva, Paulo Nozolino, Luísa Cunha). Houve quem questionasse se havia photo no BESPhoto, houve quem duvidasse se o carro do júri de nomeação tinha gasolina suficiente para ir até ao Porto. Quem pusesse em causa os critérios (ou questionasse se haveria mesmo critérios…). E, claro, não podia faltar quem falasse em compadrios. 

No BESPhoto vi trabalhos muito bons e trabalhos muito maus. Paciência, o prémio não foi feito para me agradar. Nem a mim, nem ao meu dentista. Foi feito para distinguir criação artística com base na linguagem fotográfica (em sentido muito amplo, como se tem notado). E eu, nesta fase do campeonato, prefiro olhar para o que se ganhou: ganhou-se estímulo para as práticas fotográficas que se situam fora da tradição documental; ganharam-se boas exposições; ganharam-se bons catálogos de fotografia; ganharam-se discussões sobre a imagem fotográfica e não só (coisa que raramente se faz em Portugal); ganhámos artistas que desconhecíamos; ganharam artistas muito bons que nunca tinham ganho quase nada; ganharam as galerias dos nomeados e dos premiados… ganhou a fotografia (em sentido muito amplo, como se tem notado).

Durante a última inauguração no Museu Berardo, retive duas palavras ditas a propósito desta décima: “perseverança” e “coragem”. Acho que são qualidades que se podem colar a um prémio que tem sabido ser teimoso em relação a um país onde tudo acaba prematuramente, e onde, por estranho que pareça, se desdenha o que é, em geral, bem feito.

Para já, no placard do BESPhoto a arte está a ganhar ao dinheiro. Oxalá o resultado neste jogo se mantenha e o árbitro não faça soar o apito final.

E o que se perdeu? Pouca coisa. Quase nada.



BESPhoto 2014
© David Rato

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