14 abril, 2009

O tempo suspenso em África


© Guy Tillim



Sérgio C. Andrade
(P2, Público, 11.04.2009)

Há um tempo que já passou e outro tempo que está ainda por vir na Avenida Patrice Lumumba. Esta avenida é mais do que uma estrada desgastada pelos solavancos da História, é um tempo suspenso e incerto: sabe-se onde e como começou o caminho, que rectas e curvas inesperadas lhe surgiram pela frente, e o beco em que hoje se encontra; não se sabe a que futuro vai parar.

Avenida Patrice Lumumba é a exposição que o Museu de Serralves exibe actualmente nas suas principais salas, a revelar no Porto o trabalho do fotógrafo sul-africano Guy Tillim (n. Joanesburgo, 1962). O título remete directamente para o imaginário das lutas de libertação do colonialismo, em volta da figura do líder que ajudou à independência da República do Congo face à Bélgica, e que seria assassinado em 1961, poucos meses depois de se ter tornado no primeiro-ministro do novo país, e de ter sido deposto por um golpe de Estado. Mas é o tempo presente que é reflectido nas mais de meia centena de fotografias que constituem a exposição, e cujo tom quase sépia de cores cansadas retrata também uma realidade fatigada, simultaneamente gasta por excesso e por falta de vida. Na República do Congo, mas também em Moçambique e Angola, e no Benim e Madagáscar. Há um hotel em ruínas que já foi grande hotel, e uma piscina agora transformada em tanque de águas paradas; há jardins de estátuas apeadas, sem plinto umas, sem cabeça ou membros outras; há um liceu, um consultório, um banco, um escritório, um stand da Toyota, que já não o são.

São imagens que nos "falam, de modo tocante, do fracasso das utopias europeias" - escreve o comissário da exposição, Ulrick Loock, director adjunto do Museu de Serralves -, e simultaneamente "das dificuldades hoje sentidas pela população que ocupou esses edifícios, e que tenta aceitar o seu passado colonial e a respectiva herança". Mas é uma herança ainda sem futuro previsível. É visível a desadequação das pessoas perante os edifícios e os espaços urbanos que lhe foram deixados pelos regimes coloniais.

O que sobra - também para o visitante da exposição - é um passeio pela desolação desta Avenida Patrice Lumumba.

Avenida Patrice Lumumba, de Guy Tillim
Museu de Arte Contemporânea de Serralves, Porto
Até 17 de Maio

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